O
mar de Cecília / O mar de Rosinha
(Neide Medeiros Santos – leitora votante FNLIJ/PB)
Dorme,
que eu penso.
Cada qual assim navega
pelo seu mar imenso.
(Cecília Meireles. Acalanto. In: Mar absoluto).
“O mar de Cecília” (Editora do Brasil, 2017), de Rosinha,
ganhou o prêmio de Melhor Livro de Poesia da Fundação Nacional do Livro
Infantil e Juvenil em 2018. Rosinha é o nome artístico de Rosa Maria
Campos, arquiteta e ilustradora pernambucana que vem conquistado prêmios desde
que decidiu se dedicar inteiramente à literatura infantil como escritora e
ilustradora. Começou a carreira artística em Recife, ilustrando livros de Ronaldo
Correia de Brito e Assis Lima, depois passou a ser requisitada para ilustrar e
escrever livros infantis por editoras do sul e sudeste, hoje é nome consagrado
no cenário da literatura infantojuvenil no Brasil e no exterior. A arquitetura
perdeu uma arquiteta, a literatura ganhou uma escritora e ilustradora.
Em nota inserida na
última página do livro “O mar de Cecília”, ela conta como surgiu a paixão pela
poesia de Cecília Meireles. A primeira vez que leu um livro de Cecília tinha
nove anos, um presente de seu pai. “Ou
isto ou aquilo” foi um “alumbramento” bandeiriano. Ficou
tão encantada que passou a levá-lo para todos os lugares dentro de sua mochila.
Lia em voz alta os poemas para suas bonecas e escrevia alguns versinhos no seu
caderno da escola. Agora chegou a vez de dialogar com a poeta do mar.
O título do livro está associado não apenas a “Mar absoluto”,
mas com muitos outros poemas de Cecília que têm o mar como motivo condutor. Os
poemas são apresentados em quadrinhas, sem a preocupação com a métrica, que é
livre. Embora o livro de encantamento esteja sempre presente de forma
intertextual, há intertextos com outros poemas, como este que se segue:
O mar
de Cecília
não é alegre,
nem triste.
É mar absoluto.
Será que o leitor sabe o motivo de Cecília querer morar no último andar? Leia o texto de
Cecília, depois o de Rosinha, tudo fica bem claro.
No último andar é mais
bonito
do último andar se vê o mar.
É lá que eu quero morar.
(Cecília
Meireles. O último andar. In: Ou isto ou aquilo).
Um dia Cecília
foi para o último andar,
para de lá
ver todo o mar.
(Rosinha.
O mar de Cecília).
As
ilustrações são quase todas em cor grafite e sépia, vislumbram-se alguns
detalhes em azul, como os olhos dos peixes, uma estrela mais brilhante no céu,
um detalhe no barco que singra os mares. Nas três últimas páginas impera um
azul intenso da cor do mar. Os versos que encerram o livro sintetizam o predomínio
do mar e do azul.
[Para
Cecília tudo é mar
-
e mais nada.]
As
capas (frente e verso) mostram um labirinto na cor azul sob fundo escuro que se
repete na folha de rosto. O labirinto é sugestivo, pode indicar caminhos
poéticos a ser desvendados ou caminhos a
ser descobertos pelos viajantes.(Cecília foi ótima viajante, os livros
“Crônicas de viagem” 1,2 e 3 comprovam o que afirmamos).
Com
relação ainda a capa, a ilustração do labirinto pode sugerir uma brincadeira de
esconde-esconde. Cada leitor tem a liberdade de dar uma interpretação distinta, e a leitura se
torna mais rica e mais agradável.
NOTAS
LITERÁRIAS E CULTURAIS
A
Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) divulgou a relação dos
livros premiados em 2018. Não tivemos surpresas, muitos livros indicados como o
Melhor para Jovem, para Criança, Reconto, Ilustração já foram apresentados em
nossa coluna. Segue a relação dos livros contemplados com a láurea de Melhor
Livro dentre da cada categoria. Indicamos livro, autor e editora para
conhecimento dos nossos leitores.
CRIANÇA:
Hors-concorus: A quatro mãos. Marilda Castanha. Ed. Companhia das Letrinhas.
Ainda nessa categoria foram contemplados os seguintes livros: O passeio. Paulo
Lugones. Il. Alexandre Rampazo. Ed. Gato Leitor. Rosa. Odilon Moraes (texto e
ilustração). Ed. Olho de vidro.
JOVEM:
Catálogo de perdas. João Anzanello Carrascoza. Ed. SESI-SP.
POESIA:
O Mar de Cecília. Rosinha. Editora do Brasil.
RECONTO:
Contos de Moçambique. Luan Chnaiderman. Fotografias de Christian Piana. Ed.
FTD.
INFORMATIVO:
Os trabalhos da mão. Texto de Alfredo Bosi. Il. Nelson Cruz .
TRADUÇÃO/ADAPT/CRIANÇA:
O diário de Blumka. Iwona Chmielewska Ed. Pulo do Gato.
TRADUÇÃO/
ADAPT/JOVEM: Uma vez. Morris Gelitzman. Ed. 34.
TRADUÇÃO/ADAPT/
RECONTO: Barba Azul. Anabela López.Ed. Aletria.
TRADUÇÃO/ADAPT/INFORMATIVO:
O menino Nelson Mandela. Ed. Melhoramentos.
LITERATURA
DE LINGUA PORTUGUESA: Infâncias. Textos de José Letria (Portugal) e José Santos
(Brasil). Ed. SESI-SP.
TEÓRICO:
Decifra-me ou te devoro! O mito grego na sala de aula. Vera Tietzmann. Ed. Cânone.
IMAGEM:
De flor em flor. JohnArno Lawson e Sydney Smith. Ed. Companhia das Letrinhas.
Nota:
Aqui está uma dica de bons livros infantojuvenis para crianças, jovens e
adultos (pais e professores).
(
Publicado no jornal “Contraponto” B-3, 2018)
POEMA DA SEMANA
O ÚLTIMO ANDAR
No
último andar é mais bonito:
do
último andar se vê o mar.
É
la que eu quero morar.
O
último andar é muito longe:
custa-se
muito a chegar.
Mas
é lá que eu quero morar.
Todo
o céu fica a noite inteira
sobre
o último andar.
É
lá que eu quero morar.
Quando
faz lua no terraço
fica
todo o luar.
É
lá que eu quero morar.
Os
passarinhos lá se escondem,
para
ninguém os maltratar:
no
último andar.
De
lá se avista o mundo inteiro:
tudo
parece perto, no ar.
É
lá que eu quero morar:
no
último andar.
(
Cecília Meireles. Ou isto ou aquilo)