VICENTE EM PALAVRAS – sobre dor e despedida
(Neide Medeiros
Santos – Crítica literária FNLIJ/PB)
Oh,
pedaço de mim
Oh,
metade arrancada de mim
Leva
o vulto teu
Que
a saudade é o revés de um parto
A
saudade é arrumar o quarto
Do
filho que já morreu.
(Pedaço de mim. Chico Buarque).
É sempre doloroso falar sobre a
morte, principalmente quando esta morte é prematura, a morte de um jovem. O
livro de Caio Riter - “Vicente em palavras” (Lê, 2012) – trata deste tema. O escritor
confessa que sempre quis “criar um personagem que não fosse apenas criação minha”, escrever um livro
em que o narrador (o autor) ficasse quase invisível aos olhos do leitor.
Realmente ele conseguiu essa proeza. São
vários narradores que escrevem sobre Vicente (Vico), um rapaz de quinze anos
que morre em um acidente de skate. É um romance juvenil polifônico.
“Vicente em palavras” é um livro de muitas vozes – a voz do pai, da mãe,
do irmão, da namorada, de alguns amigos. Cada uma dessas vozes vai revelando
quem era o jovem Vicente. Para a mãe, era o filho caçula, o mais querido, o
mais alegre, brincalhão, o mais cativante. O pai, Pedro Artur, se interroga:
será que fui realmente um bom pai? O que deixei de fazer por meu filho? A sua incerteza, leva-o a escrever cartas
para o filho morto. Marta é escritora e
depois da morte do filho está sempre trancada em seu escritório digitando. Será
um novo romance? Henrique, o irmão mais velho, lamenta a morte de Vicente, mas
sente “um certo alívio de saber que não haverá mais necessidade de disputar o
carinho da mãe com mais ninguém.” (p.35).
Na primeira carta que Pedro Artur faz
para o filho, ele conclui com estas palavras: “O tempo passou, a vida passou, e
agora só me resta mesmo lançar palavras no papel, na esperança vã de que,
esteja você onde estiver, elas, um dia possam alcançá-lo”. (p. 10).
No texto que a mãe está escrevendo, ela
externa toda sua dor no capítulo II: “Sei que Henrique sofre, sei que Pedro
Artur chora a perda do filho. Sei. Mas sei também que a dor que eles sentem não
pode se comparar à minha. Sou mãe. Um pedaço de mim se foi.” (p. 12). Aqui
lembramos a bonita música de Chico Buarque – ‘Pedaço de mim” que fala sobre a
morte de um filho e a dor da mãe ao arrumar o
quarto do filho querido e saber
que ele não volta mais, se foi para sempre. O sentimento de saudade de Marta é o mesmo da canção. O quarto não está
vazio porque lá está Henrique, o filho mais velho, mas Henrique é tão diferente
de Vicente! É calado, introspectivo,
sério, de sorriso contido.
Natália, a namorada, escreve um diário
e chama o ex-namorado de Vico, forma bem carinhosa. No diário, ela registra: “Não consigo fechar
os olhos. Para todo lado que eu olho, fico vendo o sorriso do Vico. Do meu
Vico. Que não é mais meu.” (p.15).
Henrique, diante da partida inesperada do irmão, recorda as férias
passadas na praia de Torres, na casa da avó. Os dois eram crianças, Henrique com
10 anos, Vicente com oito, e o susto de um quase afogamento de Vicente.
Henrique salvou o irmão, mas a mãe não compreendeu o gesto do filho mais velho
e deu-lhe castigos. Culpava-o dizia-lhe que, como mais velho, tinha obrigação
de protegê-lo. E repetia, de forma insistente: “E se o teu irmão morre? E se
ele morre?” (p. 16).
Surgem outras vozes – são as vozes
dos amigos, colegas de Vicente: os diálogos de Fred com Guga, de Vírgínia com
Fred, de Lucas com Fred, de Fred com Lara.
Sempre Fred, o apaixonado por Natália, o que sofre com a indiferença da
moça.
O pai, que antes se mantinha
distante dos filhos, ocupado com as questões de seu escritório de advocacia,
agora se volta para Henrique e resolve entregá-lo as cinco cartas que escreveu
para Vicente. Nessas cartas, Henrique irá saber os reais sentimentos do pai, a
sua opinião sobre os filhos.
E Natália? Será que vai resistir às
investidas de Fred? Ela acha ainda muito cedo para pensar em um novo amor – a
dor e a saudade são muito fortes, talvez com o tempo... quem sabe...
A morte de Vicente proporciona o
reencontro da família – pai, mãe e o filho mais velho; a superação da dor da
namorada, a aproximação entre os colegas.
Há, ainda, neste livro, uma
valorização ao ato de escrever. Marta escreve um livro que fala sobre o filho
morto, Natália registra seus sentimentos no diário, o pai escreve cartas,
Henrique escreve “palavras”.
Este
livro de Caio Riter fala sobre a morte, um tema pouco comum em livros para
jovens e adolescentes, mas o autor foi tão sutil que não chocou o leitor em
nenhum momento.
4 comentários:
Fico bastante feliz em ler tuas palavras sobre as minhas. Tão bom é quando um livro ecoa no dentro do leitor e ele se sente chamado a produzir seu olhar sobre o texto lido. Assim, só posso agradecer a generosidade tua em conversar com o meu Vicente, agora nosso. Abraços, Caio Riter
Caio,sou seu fã.
Amei o Livro muitos veem ele e julgam pela capa tipo naas como assim esse livro não deve ter conteúdo ou ate mesmo falam que ele é sem graça mas para quem realmente ama lê o título capa ou tanto faz não importa eu mesmo peguei ele e quando comecei a ler não queria que acabasse o livro por que fui me aprofundando na leitura fui viajando com as palavras imaginando,cada cena ... Esse livro é o melhor que todos que li ate hoje, já é a segunda vez que leio ele e não canso ... Parabéns pela obra perfeita que escreveu ������❤❤❤❤❤��
Quem era o Fred?
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