“PRIMEIRA
PALAVRA” E O JABUTI DE ILUSTRAÇÃO
(Neide
Medeiros Santos – Leitora votante FNLIJ/PB)
Acredito na possibilidade de
um livro influenciar o pensamento e, portanto, a vida de alguém.
(Elvira
Vigna. Nota apensa ao livro “Primeira Palavra”).
“Primeira Palavra” (Ed. Abacatte, 2012), texto de Tino
Freitas e ilustrações de Elvira Vigna, ganhou o prêmio Jabuti de Ilustração
2013. Tino Freitas é escritor cearense
radicado em Brasília, e este texto já havia sido publicado na antologia de
contos de autores de literatura infantojuvenil brasileira em espanhol no livro
“Cuentos infantiles brasileños”, uma publicação da embaixada do Brasil na Costa
Rica. Agora os leitores brasileiros desfrutam desta bonita história com
belíssimas ilustrações de Elvira Vigna.
Em 2011, publicamos na coluna “Livros&Literatura”, no
jornal “Contraponto”, o artigo “A literatura brasileira vai à Costa Rica” com
breves comentários sobre alguns dos 25 contos selecionados. Para compor essa
antologia, foram escolhidos textos de literatura infantil publicados no Brasil durante 40 anos (década de 1960 até o ano
2000).
“Primeira Palavra”
ganhou o prêmio Jabuti de Ilustração, assim é bom conhecer um pouco do trabalho
de Elvira Vigna. A ilustradora, que também escreve livros para crianças e
adultos, nasceu no Rio de Janeiro, tem formação acadêmica em Jornalismo e
cursos na área de Artes Plásticas, Cinema e Teatro.
Fui
apresentada aos livros de Elvira Vigna por intermédio da professora Maria Antonieta
Antunes Cunha. Nos idos de 1980, Elvira Vigna escreveu livros infantis para a editora
Miguilim (na época esta editora era coordenada por Antonieta Cunha), e
destacamos, entre eles, “Problemas com cachorro” (Ed. Miguilim, 1982) e “A
pontinha menorzinha do enfeitinho do fim do cabo de uma colherzinha de café” (Ed.
Miguilim, 1983). Depois vieram muitos outros livros escritos e ilustrados por
essa autora. Roseana Murray escreveu vários livros de poesia que receberam
ilustrações de Elvira Vigna. A produção literária e pictórica da artista da
palavra e dos pincéis é vasta.
Comecei a ler “Primeira Palavra” atraída pela ilustração.
A capa apresenta um gato com pelos dourados e eriçados, tem um olhar firme e está apoiado nas patas
dianteiras em cima de livros ou de uma
mesa; a seu lado aparecem alguns livros
sem identificação dos títulos e dos autores. A quarta capa é toda em azul
escuro e traz o chamamento da editora para o conteúdo do livro.
Depois que terminei de ler a história, lembrei-me do
conto de Andersen “A pequena vendedora de fósforos”. Tenho preferência especial
por este conto. Posteriormente, fui ler
as observações feitas pelo autor na última página do livro e me deparo com esta
afirmativa: A história... “que escrevi neste livro foi inspirada numa adaptação
do conto “A Menininha dos Fósforos”, de Hans Christian Andersen que ganhei de
minha mãe e li, emocionado, quando tinha cinco anos”.
Vamos percorrer as páginas de “Primeira Palavra”, examinar
o texto e as ilustrações. A intertextualidade já foi detectada com a explicação
de Tino Freitas.
O cenário
escolhido para o desenvolvimento da história é uma livraria, ou melhor, um
local que vendia livros usados, um sebo. Um sebo contém livros mais valiosos do
que uma livraria comum, lá se acham preciosidades. Livros de todo tipo são
encontrados – livros de arte de literatura infantil, de imagens, romances, poesia,
gibis, revistas antigas, almanaques, dicionários. Uma coleção variada que já
passou pelas mãos de inúmeros leitores.
É nesse local
cheio de livros antigos que mora um gato siamês. O local era frequentemente visitado por uma
menina, uma pedinte de rua, que não sabia ler, mas adorava mergulhar naquele
labirinto de livros, principalmente na seção de livros infantis. Os preferidos
eram aqueles que continham figuras. Havia um que cativava mais do que os outros
– era um livro apenas de imagens – neste livro aparecia a ilustração de uma bruxa
e um gato. Entre a menina e o gato do sebo se estabelece uma cumplicidade, um
entendimento mútuo.
Muitas vezes a menina adormecia encostada numa estante.
Quando era hora de fechar o estabelecimento, o dono aparecia e a acordava,
mostrando-lhe o caminho da rua. Parecia
não ter família, estava com sete anos e não sabia ler, nunca fora à escola.
Contar, ela sabia. As pessoas davam-lhe algumas moedas, mas só sabia contar até
vinte, Não havia necessidade de saber mais do que vinte, não conhecia dinheiro
maior do que uma nota de vinte reais.
No dia que completou oito anos, desejou ganhar um
presente de aniversário e o melhor presente seria o livro da bruxa e do gato.
Era um sonho quase impossível. Como arranjar dinheiro para comprar o
livro? O pouco que recebia das pessoas
só dava para comprar alguma comida. Foi o medo e o desejo que forjaram um
plano. O que aconteceu é surpresa, está bem contado na história de Tino
Freitas. No desfecho, mais uma vez, encontramos intertextualidade com o conto
de Andersen.
Nas ilustrações,
um aspecto nos chama a atenção é a
presença das cores fortes – o azul intenso, o vermelho e o tom sombrio do local
que aparece nas paredes da livraria. A figura da menina é vista sempre através
de um reflexo de vidro ou espelho. Quando está fora da livraria, olha para as estantes cheias de livros com
olhos de espanto. O gato é retratado muito
bem postado em cima dos livros. Vigiando-os ou tentando adivinhar os segredos guardados
nas páginas dos livros? Gato é bom
pensador!
Visualizamos lombadas de vários livros, só é possível ler o
nome de um autor - Autran Dourado. Os outros não trazem títulos nem nomes dos
autores. Por que a escolha recaiu em
Autran Dourado? Alguma ligação entre esta menina abandonada e a personagem Biela,
de Autran Dourado? Conjeturas.
Se o leitor ficar
encantado pelas ilustrações como eu fiquei, irá gostar, também, da história
urdida por Tino Freitas. Boa leitura é o que desejamos.
Nota: Este texto vai para o menino Davi Pessoa que está
aprendendo o que é intertextualidade.
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