Livros que falam
(Neide Medeiros Santos – Leitora votante FNLIJ/PB)
Ler é
sonhar pela mão de outrem.
(Fernando Pessoa)
Pessoas que gostam de ler livros é um caso bem comum, mas
livros que leem pessoas é alguma coisa estranha. “O livro que lê gente” (Ed.
Cortez, 2016), de Alexandre de Castro Gomes, ilustrado por Cris Alhadeff, conta
a história de livros falantes que moram em uma biblioteca.
Na biblioteca pública de uma cidade não identificada, os
livros velhos e pouco lidos ficavam sempre localizados nas prateleiras mais
altas das estantes. Afinal os leitores nunca procuravam por aqueles que estavam
carcomidos pelo tempo, apresentavam manchas amareladas, alguns estragados pelas
traças, esses não precisavam ficar em local acessível. Vez por outra chegava um livro velhinho e vinha
fazer companhia aqueles mais antigos.
À noite, quando a biblioteca fechava as portas, os livros
saiam dos seus lugares e conversavam sobre suas próprias histórias. Aladim era
um dos habitantes da casa, tinha muita história para contar e sentia-se
desprezado. Crianças e jovens procuravam livros mais
modernos que falavam sobre futebol, esportes, vampiros, terror. Isso deixava
Aladim muito triste. O novo companheiro, Pinóquio, era mais otimista. Aguardava
novos leitores e começou a contar para Aladim as peripécias do boneco de
madeira que tinha encantado crianças do mundo inteiro.
Lamentar o desprezo dos leitores não adiantava muito,
Pinóquio afirmou que seria bem melhor observar os frequentadores da biblioteca.
Aladim confessou que achava muito divertido ler as pessoas. Chamou a atenção do amigo para um menino de
dez anos que lia um livro sobre esportes. Estava com a roupa que apresentava
manchas de barro, devia ter vindo de um treino de futebol. A menina, sentada ao
lado do menino, tinha outros interesses – segurava um livro sobre vampiros. Era
possível sentir pela fisionomia o interesse de cada leitor.
A bibliotecária supervisionava tudo. Chamava-se Anita.
Pinóquio perguntou a Aladim se ele já tinha lido a história da bibliotecária.
Morando há algum tempo na biblioteca, claro que ele sabia de muitos fatos
relacionados com a vida de Anita. Havia um rapaz que vez por outra visitava a
biblioteca e deixava a bibliotecária
toda suspirosa. Devia ser seu namorado, ela se dirigia ao rapaz de forma
carinhosa, chamava-o de “Mozinho”. Ele
gostava de ajudar a arrumar os livros nas prateleiras. Depois de certo tempo,
“Mozinho” desapareceu. Anita agora vivia triste, olhava para a janela com um
olhar comprido, suspirava cada vez mais. Um dia, Anita amanheceu toda alegre.
Trazia uma carta na mão, certamente era do namorado. Guardou a carta na gaveta.
Abria a gaveta, tirava a carta e lia, relia, fez isso inúmeras vezes. Acredito
que as noticias eram boas. O semblante da bibliotecária denunciava sua alegria.
O resto da história eu não conto não.
Vamos conhecer um pouco do autor do livro e da ilustradora.
Alexandre de Castro Gomes já escreveu inúmeros livros para o público
infantojuvenil. Atualmente é o presidente da Associação de Escritores e
Ilustradores de Literatura Infantil e juvenil (AEILIJ). Recebeu vários prêmios
nacionais, entre eles o Prêmio Cidade de Manaus de Teatro Infantil.
Cris
Alhadeff tem formação em Desenho Industrial pela Escola de Belas Artes da UFRJ. Como ilustradora, já participou do Catálogo
de Bolonha e foi a idealizadora e uma das fundadoras do movimento “Nós,
Ilustradores, somos Autores”. Esse
movimento tem por objetivo informar sobre a importância e o peso da ilustração
na literatura infantil e juvenil.
Na ilustração deste livro, há um detalhe que chama a
atenção do leitor – a presença de um gato em todas as páginas. Às vezes o
bichano apresenta um ar sonolento, fica circunspecto se o momento exige
atenção, risonho quando tudo está bem. É companheiro dos usuários da
biblioteca, de Anita e dos livros. É um
personagem observador que tem um papel tão importante na história quanto os
outros personagens.
Se você gostou desse breve resumo da história, procure
ler o texto na íntegra, irá descobrir muita coisa que não foi revelada,
inclusive o teor da carta que Anita recebeu. Ainda há outras boas surpresas
nesse livro.
LEITURA RECOMENDADA
O editor José Xavier Cortez completou 80 anos. Para
marcar esta data, a Cortez Editora lançou o livro “Cortez em seus 80 anos” que
conta um pouco da vida desse nordestino de Currais Novos (RN). A vida de um menino pobre, nascido no sítio
Santa Rita, que se tornou livreiro e, posteriormente, dono de editora, é um
exemplo para todos aqueles que acreditam no poder da leitura e do estudo.
O livro se inicia com depoimentos das filhas do editor e
termina com uma entrevista que inclui alguns fatos do cotidiano de José Cortez.
Um dos capítulos – “O cidadão Cortez” apresenta fatos ligados às suas atividades
como livreiro e editor. A experiência no ramo proporcionou curiosas histórias
que descrevem bem o homem e a índole de Cortez. Certa vez, um professor
confessou que roubara livros da Livraria Cortez. A reação do livreiro ao saber
da história foi desejar que os livros surrupiados tivessem ajudado a formar
alunos que demonstrassem apreço ao livro e ao conhecimento. Um assalto à
editora também foi motivo para dar uma
lição a um dos assaltantes. Era um rapaz nordestino como ele. Na conversa com
esse assaltante, ofereceu-lhe dezoito livros recém-lançados da linha
infantojuvenil com esta recomendação: “Garoto, espero sinceramente que estes
livros ajudem seus filhos a não terem uma vida como a sua.”.
Com duas biografias publicadas: “Cortez- a saga de um
sonhador” (finalista do Prêmio Jabuti) e “Como um rio – o percurso do menino
Cortez”, destinado ao público infantojuvenil, José Xavier Cortez relembra sua
trajetória em prol do livro e da leitura com muito orgulho. Sente-se realizado
com tudo que conquistou, mas principalmente com o que fez para tornar uma
sociedade mais justa e mais consciente através do conhecimento dos livros.
2 comentários:
Obrigado! Adorei a resenha!
Amei a resenha !
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