quinta-feira, 6 de agosto de 2015

O livro das simpatias

Livro das simpatias: nonsense e humor
            (Neide Medeiros Santos – Leitora votante FNLIJ/PB)

                        Eu quero um barco nas nuvens
                        um porto calmo
                        e a desarrumada vertigem
                        das velas dando adeus.
                        (Antonio Barreto. Livro das simpatias).

            Há várias maneiras de um livro cativar o leitor, pode ser pelo título, como “Enterrem meu coração na curva do rio”, “Olhai os lírios do campo”; pelas ilustrações, e citamos, “Tempo de voo”, “Rua Âmbar”, esses dois na área dos infantis. Há outros elementos que despertam o interesse do leitor – a capa, as epígrafes, as notas explicativas, as apresentações.  O teórico francês Gérard Genette denominou esses acessórios que complementam os livros de “paratextos”.

            O “Livro das simpatias” (Ed. Baobá, 2014), de Antonio Barreto, com ilustrações de Guili Seara, é um livro rico de paratextualidades. Se a capa chama a atenção pelo bonito colorido e os minúsculos desenhos, as ilustrações que antecedem os textos e tomam uma página inteira foram inspiradas nos desenhos em bico de pena de artistas do século XIX: Thiebault, H. Emy, Coste e constitui mais um motivo para atrair o leitor.  São treze textos apresentados de modo humorístico e, muitas vezes, desconexos, levando-nos a pensar nos poemas de Edward Lear, marcados pelo nonsense.
  
            Além das ilustrações que acompanham cada texto, logo após o título, aparece uma epígrafe. O poeta Mário Quintana, sempre reverenciado e citado neste livro, comparece com esta epígrafe: Teus silêncios são pausas musicais.  Quintana é intertextualizado nesta outra epigrafe: Procurar pelas coisas, mesmo as impossíveis, / É avivar de longe a brasa das estrelas. Ora... O que seria das coisas invisíveis, / Não fosse a ilusão de aprender a vê-las?  

            Podemos dividir o livro em duas partes; na primeira, encontramos treze receitas de simpatia irreverentes; na segunda, vêm explicações que nos são fornecidas pela sabedoria popular e não trazem a marca do nonsense.

            Vamos apresentar exemplos da simpatia do primeiro bloco e outra do segundo para que o leitor sinta como, embora diferentes, elas se complementam.

            “Para encontrar um príncipe encantado”, o narrador sugere que se procure com uma lanterna um sapo na lagoa, e coloque sobre sua cabeça uma cartolinha de mágico, em seguida, vire-se de costas e jogue duas mechas de seus próprios cabelos no brejo. Se o belo rapaz não aparecer, tente novamente.

            Para encontrar casamento, a sabedoria popular indica outro tipo de receita. É recorrer a Santo Antônio Casamenteiro. Esse santo é responsável por tirar muita moça do caritó. As rezas, as promessas, tudo vale, é ter fé no santo e esperar que apareça o marido desejado.

            Quanto à origem das simpatias, elas são desconhecidas. É difícil encontrar uma definição própria para essa crendice ou superstição. Folclore? Ficção? Verdade? Fantasia? Talvez pertençam “ao reino espantado das coisas imaginárias.”

            Não procure o leitor jovem (o livro é destinado aos jovens, mas pode ser lido com muito prazer pelos adultos) soluções ou simpatias plausíveis, é tudo apresentado de modo desconexo, risível e com muito humor.  

            Neste livro o que realmente nos chamou mais a atenção foram as ilustrações, recriadas a partir de desenhos antigos, seguindo-se as epígrafes, as intertextualidades com poemas de Quintana.  Acrescentamos a combinação dos rituais poéticos que se mesclam com o nonsense, o humor e a fantasia, além do predomínio dos elementos paratextuais.

            Para melhor conhecer os autores – escritor e ilustrador – vai um pouco de cada um deles. Antonio Barreto nasceu em Minas Gerais e afirma que antes de “vestir a carapuça de escritor” fez várias coisas na vida: estudou História, Letras e Engenharia Civil. Viajou muito, construiu pontes, edifícios, estradas, depois descobriu que a única coisa que o fazia realmente feliz era “ler, reler, escrever e reescrever”, aí se transformou em escritor.

            Giuli Seara veio da região Norte do Brasil, do Amapá, nasceu em plena Floresta Amazônica. É designer gráfico há mais de trinta anos, já conquistou mais de 40 prêmios nacionais e internacionais. Para ilustrar o “Livro da simpatia”, utilizou a técnica da colagem sobre desenhos de bico de pena de ilustradores antigos e o resultado foi muito bom.


            A melhor receita para este finalzinho de férias é ler o “Livro das Simpatias”.