sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

É Tempo de Leitura



LIVROS&LITERATURA

É Tempo de Leitura

(Neide Medeiros Santos – Crítica literária da FNLIJ/PB)


A leitura nos leva para o espaço e o tempo sensíveis ao coração, o que é, para não dizer mais, uma forma de felicidade.

(Davi Arrigucci Jr.)



Recebemos e adquirimos nesses últimos meses vários livros que falam sobre problemas ligados à leitura, à formação do leitor, ao exercício do ler e do escrever.

Da Editora Biruta, chegaram-nos os livros A Formação do Leitor Literário em Casa e na Escola, de Caio Riter e A Convite das Palavras: motivações para ler, escrever e criar, de Jorge Miguel Marinho. É sobre esses dois livros que voltamos nossa atenção.

Caio Riter divide o livro em duas partes. Encontramos textos que falam sobre as leituras feitas em casa – tempo de ouvir e contar histórias, e as leituras na escola – tempo de formar leitores.

Ao relembrar sua vida de criança, o escritor afirma que não nasceu em uma família convencional de leitores. Na sua casa não havia biblioteca nem estante com livros.

Se a casa do menino Caio era “uma morada de poucos livros”, ele teve uma mãe que lhe contava histórias e recitava quadrinhas, algumas eram cantigas e vinham acompanhadas de um ritmo musical. Ouvir histórias e as brincadeiras com as palavras conduziram-no ao reino dos livros.

O tempo passou... Caio Riter cresceu, estudou, casou, teve filhas. Quando nasceu Carolina, Helena, a filha mais velha, estava com quatro anos e pediu ao pai que lesse uma história para a irmãzinha recém chegada ao mundo. A casa do escritor, agora, era uma morada com muitos livros.

O tempo passou... Caio tornou-se escritor e professor, voltou-se para o processo de formação de leitores literários na escola, tendo como lema os seguintes princípios: ler é contar histórias; ler é prazer; ler é um ato de liberdade.

Como professor, ele se preocupa com o acervo das bibliotecas. A biblioteca não é apenas um lugar de pesquisas, mas espaço de troca e de partilhas literárias.

Para Caio Riter, os professores deveriam ter meios para ensinar as crianças e adolescentes a perceberem a beleza e a magia que está nas entrelinhas de um texto literário, a olhar e admirar um objeto artístico.

Mas afinal o que é ser leitor? Caio Riter nos dá uma boa resposta:

Cada vez mais sou tomado pela certeza de que ser leitor é possibilidade de construção de um ser humano melhor, mais crítico, mais sensível, alguém capaz de se colocar no lugar do outro; alguém mais imaginativo e sonhador; alguém um pouco mais liberto dos tantos preconceitos que a sociedade vai impondo-nos a cada dia, a cada situação. (p. 35).

No livro A Convite das Palavras, Jorge Miguel Marinho reúne artigos, ensaios e crônicas que revelam sua experiência como professor de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira durante mais de trinta anos. Ao lado da profissão de professor, é autor de muitos livros para crianças e jovens, tendo conquistado vários prêmios literários.

A leitura chegou tarde na vida de Jorge. Os seus primeiros contatos com a literatura foi com a obra de Adelaide Carraro que, para muitos, é leitura “apelativa”. Depois vieram outras leituras – Machado de Assis, Exupéry, Clarice Lispector, Graciliano Ramos, Mário de Andrade. O vírus da leitura estava inoculado.

Neste livro, Jorge Marinho navega por muitas águas: a da poesia, a da narrativa, a do cordel, a dos cronistas, tudo isso permeado com bons exemplos de textos literários.

Para Marinho, o poema “Os ombros suportam o mundo”, de Carlos Drummond de Andrade, é o poema mais triste da Literatura Brasileira contemporânea. Fica o convite para uma releitura desse poema e a aquiescência ou não com a opinião do autor.

Cartas, diários, entrevistas e muitas outras coisas mais integram esse rico universo das motivações para ler, escrever e criar.

Como estamos em período de férias, nada melhor do que reservar um pouco do nosso precioso tempo para a atividade da leitura que, na opinião de Davi Arrigucci, citado por Jorge Marinho, é uma forma de felicidade.

NOTA: O título deste artigo é uma homenagem à coluna É Tempo de Leitura, publicada na revista Verdes Anos (2003/2004), sob a coordenação editorial da poeta e jornalista Yolanda Limeira

sábado, 12 de dezembro de 2009

NATAL: tempo de leitura e releitura




LIVROS & LEITURAS
NATAL: tempo de leitura e releitura
(Neide Medeiros Santos – Crítica literária da FNLIJ/PB)

Mudaria o Natal ou mudei eu?
(Machado de Assis. Soneto de Natal)

Harold Bloom, crítico literário norteamericano, publicou uma coleção de quatro livros com o título – Contos e Poemas para crianças extremamente inteligentes de todas as idades – que foi traduzido por José Antônio Arantes e publicado pela Editora Objetiva.
Cada volume traz selo de uma estação do ano. Volume 1 – Primavera; volume 2- Verão; volume 3 – Outono; volume 4 – Inverno.
Na apresentação do primeiro volume, o autor discorre sobre o critério de seleção dos contos, fábulas e poemas que integram o universo antológico da coleção.
Foram incluídos 39 contos e fábulas e 74 poemas. Lewis Caroll, o autor de Alice no país das maravilhas, comparece com o maior número de textos. (Louvemos Monteiro Lobato que, nos anos 30, do século XX, teve a perspicácia de traduzir Alice no país das maravilhas para as crianças brasileiras).
E vem esta afirmativa de Bloom que reflete, também, o pensamento de Antonio Candido e Ana Maria Machado, escritores já citados em textos apresentados nesta coluna:
Não concordo com a categoria literatura para criança ou literatura infantil, que teve algum mérito no século passado, mas que agora é, muitas vezes, a máscara de emburrecimento que está destruindo nossa cultura literária. (2003:12, 1º. volume).
O crítico afirma, ainda, que os livros que leu quando tinha entre cinco e 15 anos de idade continuam sendo lidos aos 70 anos. São aqueles livros que não envelhecem, é “novidade que permanece novidade”.
Nessa introdução, Bloom explica o porquê do surgimento da antologia. Quando começou a trabalhar em Por que ler, pensou em escrever um livro para leitores jovens e foi buscar, nas suas leituras infantis e juvenis, aqueles textos que encantaram o “menino solitário”.
A introdução do livro é um verdadeiro passeio pelas leituras e pela vida de Harold Bloom. Se os textos citados pelo renomado crítico nem sempre estão disponíveis para os leitores brasileiros, a leitura dos textos coletados constitui “pequenas pérolas” literárias que merecem ser lidas e relidas.
Agora, vamos deixar o livro de Bloom, passear pela literatura brasileira e relembrar escritores e poetas que estão à espera de leitores.
Podemos começar pelos livros do maior clássico da literatura brasileira – Machado de Assis. Que tal a leitura do Soneto de Natal? Dom Casmurro merece uma releitura. Sempre descobrimos algo de novo nos textos machadianos. Machado é um manancial inesgotável, que o diga Moacyr Scliar que já fez recriações de vários textos machadianos.
E São Bernardo, de Graciliano Ramos? Quanta beleza encontramos no capítulo 17 deste livro! Como estamos em tempo de floração dos paus d´arco nas ruas de João Pessoa, é válido transcrever este belo texto do escritor alagoano:
Estávamos em fins de janeiro. Os paus-d´arco floridos salpicavam a mata de pontos amarelos; de manhã a serra cachimbava; o riacho, depois das últimas trovoadas, cantava grosso, bancando rio, e a cascata em que se despenha, antes de entrar no açude, enfeitava-se de espuma.
José Américo de Almeida escreveu um bonito livro sobre a cidade de João Pessoa. Cidade de João Pessoa- roteiro de ontem e de hoje que recebeu uma reedição com o patrocínio da Prefeitura da cidade de João Pessoa e ilustrações em aquarela de Sóter Carreiro.
Vejamos um pequeno excerto do texto O que se mostra, inserido no livro citado:
A lagoa do Parque Sólon de Lucena, velho sítio dos jesuítas, circulada da Palmeiras Imperiais, é o ponto de mais atração da cidade.
O pau d´arco que arboriza este parque cobre-se de ouro na sua estação e o bambual esconde um restaurante. Junto está o busto de Augusto dos Anjos, o extraordinário poeta do “Eu”.
A paisagem pode ter sofrido algumas modificações, mas os paus d´arco e o busto de Augusto dos Anjos continuam resistindo ao tempo enfeitando a Lagoa.
Nesse itinerário literário, Augusto dos Anjos não pode ser esquecido. O livro com todos os sonetos do poeta é um presente bem-vindo. Há poemas de Augusto dos Anjos que primam pela beleza poética e lembramos: Vandalismo, A árvore da serra e Ricordanza della mia gioventú.
Para não despertar ciúmes, citei apenas os escritores mortos, mas entre os autores vivos há muita coisa boa nas livrarias. Aproveite as festas natalinas e compre livros

sábado, 5 de dezembro de 2009

FLICTS – um clássico da literatura infantil brasileira




LIVROS&LEITURAS
FLICTS – um clássico da literatura infantil brasileira
(Neide Medeiros Santos – Crítica literária da FNLIJ/PB)

Clássico não é livro antigo e fora de moda. É livro eterno que não sai de moda.
(Ana Maria Machado. Como e por que ler os Clássicos Universais desde cedo)

O que é um texto clássico? Muitos críticos tentaram responder a esta inquietante pergunta. Ítalo Calvino, no livro Por que ler os clássicos, faz observações bem pertinentes a respeito do conceito de livros clássicos.
Os clássicos pedem sempre uma releitura, são livros que permanecem no tempo. É o tipo do livro que nunca termina de dizer o que tinha para dizer. Clássico não quer dizer livro antigo, é livro que não envelhece, oferece sempre novidades. Sua leitura ocasiona novas descobertas.
Se partirmos dessas premissas de Calvino, concluiremos que Flicts é um clássico no universo da literatura infantil brasileira. É um livro que não envelheceu, cada leitura propicia sempre novas descobertas.
Este ano Flicts completou 40 anos. A editora Melhoramentos preparou uma edição especial, contendo, além da reedição da história, informações sobre o livro.
Vamos percorrer essa edição comemorativa com o olhar voltado para a pesquisa informativa – Uma história (de uma cor) e tanto! Concepção, Pesquisa, Organização e Design de Luís Saguar e Rose Araujo.
O Início da História.
Em 1969, Ziraldo apresentou ao editor Fernando de Castro Ferro o projeto de uma publicação - uma coletânea com cartuns e as histórias de seu personagem Jeremias. O editor gostou da ideia, mas disse ao artista que publicaria se ele produzisse primeiro um livro para crianças. O prazo para apresentação do livro foi curto, e Ziraldo sabia que não havia tempo para fazer muitas ilustrações, daí surgiu a opção pela utilização das cores como personagens da história.
Flicts nasceu como livro pioneiro. Abordava um tema atual – a chegada do homem à lua, mas esta revelação só é descoberta na última página. Ziraldo criou, também, uma história que trata do “preconceito e da exclusão”.
O lançamento do livro no Rio de Janeiro e São Paulo foi consagrador. Vários críticos, poetas, escritores, jornalistas, escreveram textos em mais de 20 jornais e revistas no eixo Rio-São Paulo, ressaltando a importância de Flicts.
Carlos Drummond de Andrade, que não conhecia pessoalmente Ziraldo, escreveu, no jornal Correio da Manhã, um texto com este título: Flicts: o coração da cor. Seguiram-se, posteriormente, comentários de Rachel de Queiroz, Dom Marcos Barbosa, Millôr Fernandes, Walmir Ayala, Tarso de Castro e muitos outros.
A Órbita Editorial.
A 1ª edição do livro foi de 10 mil exemplares. Em apenas seis meses ganhou uma primeira reimpressão. Em 1984, dezesseis anos depois, Flicts foi publicado pela Editora Melhoramentos. Nesta editora, ultrapassou a marca de 64 edições, com mais de 300 mil exemplares vendidos.
A trajetória internacional do livro começou cedo e já foi traduzido para diversos idiomas.
Nas comemorações do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil, em 2008, a princesa Aiko recebeu uma edição especial de Flicts em japonês. Em janeiro de 2009, o livro foi lançado, no Japão, pela Editora Ofusha, uma edição belíssima em papel casca de ovo com tradução de Noriko Matsumoto.
O Universo de Flicts.
O universo de Flicts é muito diversificado. Foi transformado em filme de curta-metragem, peça de teatro, tema de escola de samba (Juiz de Fora, MG), música, com interpretação do Quarteto em Cy, ballet, documentário de televisão e cartão telefônico.
A professora Vânia Maria Resende (FNLIJ-MG) apresentou sua tese de doutorado na USP sobre Flicts com o título: Revelações Poéticas sob o Signo de Flicts e Reflexos Prismáticos em Obras de Autores de Língua Portuguesa.
Há duas curiosidades interessantes sobre o livro.
Quando Neil Armstrong, o primeiro homem que pisou na lua, esteve no Rio de Janeiro e Ziraldo contou-lhe a história de Flicts ele confirmou que a Lua realmente tinha a cor de FLICTS.
Dom Hélder Câmara recitava Flicts de cor. Para Ziraldo essa era uma prova de que a obra realmente existia.
2009 é o ano da França no Brasil. Nada melhor do que ler a versão dos três primeiros versos do livro na língua de Victor Hugo:
Il y avait une fois une couleur
très rare et très triste
qui s´appellait Flicts.

Para encerrar nossa conversa, convidamos o personagem Jeremias. Ele tem um recadinho para os leitores:
“Neste Natal, dê Flicts de presente!”