domingo, 22 de dezembro de 2013

O pinheirinho de Natal e O guarda-chuva verde



O pinheirinho de Natal e O guarda-chuva verde
(Neide Medeiros Santos – Leitora-votante FNLIJ/PB)

Mudaria o Natal ou mudei eu?
(Machado de Assis. Soneto de Natal).

             Tatiana Belinky traduziu e adaptou a bonita história de Andersen – “O pinheirinho de Natal”, um conto que, além da poeticidade que envolve todos os contos de Andersen, traduz a preocupação do escritor com o meio ambiente. O Natal é uma época de muito frio na Europa e antes do advento da eletricidade usava-se lenha para aquecer as noites frias do inverno europeu. Este conto de Andersen trata de modo muito humano do drama do pinheirinho que serviu de enfeite na sala de visitas na época de Natal e depois foi queimado na lareira. 
A história que vamos apresentar “O guarda-chuva verde” (Ed. SM, 2011), do escritor coreano Yun Dong-jae, com ilustrações de Kim Jae-hong, não é um conto natalino, mas vem revestido de muita ternura e se adapta muito bem para uma reflexão de fim de ano.
Yun Dong-jae nasceu em Cheongsong, província de Gyeongbuk, Coreia do Sul, estudou literatura coreana no programa de pós-graduação da Universidade Goryeo. Em seus livros retrata a poesia do cotidiano das crianças e apresenta dramas de um mundo desigual, mas  deixa sempre transparecer um halo de esperança.
Kim Jae-hong é também coreano e acredita que “um mundo bom é aquele em que as crianças são felizes”. Ele se empenha em “encontrar a esperança por meio dos desenhos”.  
A capa do livro traz um enorme guarda-chuva que envolve as duas capas (frente e verso). Na primeira página, não encontramos nenhuma mensagem verbal, apenas a ilustração de uma janela e a figura de uma menina que caminha na rua conduzindo um guarda-chuva verde.
 Na segunda página, ficamos sabendo que ela vai para a escola. Prosseguindo a narrativa, econômica em palavras e expressiva nas ilustrações, observamos que  encontra um mendigo sentado na calçada, está encostado ao muro de uma papelaria.  Apesar da chuva, ele está dormindo, o que causa espanto à menina. E vejam o efeito sinestésico do texto verbal: “Ao lado uma lata amassada também dorme”...
A mulher da papelaria resmunga porque o mendigo atrapalha suas vendas – “é um velho louco azarento” e está encostado bem junto ao muro de sua loja. Os meninos que vão à escola passam e mexem com o pobre velho – dão-lhe chutes, pontapés, fazem chacota. Indiferente a tudo e a todos, ele continua imóvel, levando chuva e encostado na parede com a única companhia -  sua velha lata.
A menina sente compaixão daquele que é desprezado por muitas pessoas. No intervalo do almoço, Young-i, a menina desta história, olha pelo portão da escola e o velho mendigo ainda dorme debaixo da chuva. Ela  resolve, de forma sorrateira,  sair da escola e escora delicadamente o guarda-chuva verde de plástico sobre a cabeça do velhinho,  e volta para a sala de aula.
Quando as aulas terminam, o céu está claro, a chuva passou, a menina  olha para o muro e tem uma surpresa – o velho mendigo não está mais ali, nem a lata amassada,  apenas se vê o guarda-chuva verde de plástico. O mendigo desapareceu e não levou o presente. A ilustração da última página mostra o guarda-chuva verde em pé, encostado na parede. Para onde ele teria ido?
O livro termina sem que o leitor saiba o que aconteceu com o velhinho. Teria morrido?  Foi recolhido para um abrigo? O desfecho fica em aberto.
O guarda-chuva verde é um símbolo de múltiplos significados.  Atente-se para a cor – é verde, uma cor que conota esperança. O objeto também representa um abrigo, um amparo para a chuva, uma proteção. A atitude da menina (dar seu guarda-chuva) revela uma ação sobejamente humana, somente possível em pessoas sensíveis.
A mulher da papelaria e os meninos que passam na rua e vão para a escola representam o lado capitalista  da sociedade, aqueles que só valorizam quem tem dinheiro, desprezam os mais humildes, detrata-os com palavras, gestos, pancadas. Recorrendo a Erich Fromm, a menina é o SER, a mulher da papelaria e os meninos, o TER.    
Este conto está bem condizente com o Natal – devemos olhar para quem está precisando de ajuda, de amparo. Não vamos deixar que aqueles que precisam de abrigo se molhem na chuva.

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

ONDE ESTÁ O OURO?



ONDE ESTÁ O OURO?

                       (Neide Medeiros Santos – Leitora votante FNLIJ/PB)



- O meu nome é Severino,
não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
que é santo de romaria
deram então de me chamar
Severino de Maria;
(João Cabral de Melo Neto. Morte e Vida Severina. Auto de Natal pernambucano). 


             “Ouro dentro da cabeça” (Ed. Autêntica, 2012), de Maria Valéria Rezende, é uma história contada sob o ponto de vista do protagonista Coisa-Nenhuma que, no decorrer da narrativa, vai recebendo outras denominações – Piá, Caroço e Marílio da Conceição. 
            Como Severino, personagem do poema de João Cabral de Melo Neto, o protagonista começa fazendo sua apresentação. Ele diz que vai contar a sua história que é de um lutador que correu sérios perigos, andou o Brasil inteiro à procura de um tesouro que não era de ouro nem de prata, era de coisa mais preciosa. E onde estava esse tesouro? O grande segredo só será revelado no fim da história.
            Vamos acompanhar a narrativa, seguir os seus passos de acordo com os diferentes nomes que o personagem vai adquirindo na sua árdua peregrinação. 
            Coisa-Nenhuma nasceu e cresceu sem nome em um lugar bem escondido, difícil de se achar no mapa, a única referência desse local desolado é que tinha umas penhas, as Pedras do Perdão.  Havia muitas histórias ou lendas sobre a origem do lugar e aquele sítio se chamava Furna dos Crioulos. Era uma serra, coberta por um mato verde, na beira de um rio também verde cortado por um lajedo escuro.
            Quem era o Pai? Ninguém sabia e o pequeno foi criado sem saber quem era seu pai e muito menos como se chamava. A mãe devia ter nome, mas ninguém ousava pronunciá-lo – a lembrança dela dava uma profunda tristeza em todo mundo.  Com poucos dias de nascido, ela resolveu, por conta própria, voar para o céu dos passarinhos. E assim o menino ficou sem pai e sem mãe. 
            Quando era bem pequeno, era chamado de Miúdo, como nasceram outros guris mais miúdos, virou Coisa-Nenhuma. Esse nome foi colocado pela avó. Todas as vezes que chorava pedindo comida, a vó dizia:
            “- E vosmecê é coisa nenhuma pra comer mais do que os outros?” (p. 14).
            Coisa-Nenhuma  Nenhuma foi crescendo e gostava de correr e andar pela mata. Um dia se deparou com um homem estranho, estava caído e bem doente, levou-o para casa, cuidou dele e ficou sabendo que se chamava Pajé. Esse homem era muito bom e deu ao  menino o nome  de Piá. Ele contava histórias inventadas e ensinava-lhe  novas palavras para que mais tarde  também pudesse contar histórias. Um dia o Pajé adoeceu e dormiu para nunca mais acordar. E o menino que não sabia ler herdou do Pajé uma caixa cheia de livros.
            Outros tempos se passaram. Tião dos Burros, um dos habitantes da Furna dos Crioulos, que sempre descia até à cidade para vender e comprar mercadorias chegou com uma novidade – vinha uma professora morar naquele lugar para ensinar a ler. A alegria do menino foi tão grande que não conseguia mais dormir. Finalmente chegou o grande dia - a professora era linda, chamava-se Marília, ia satisfazer seu grande sonho: estudar e aprender a ler. O sonho durou apenas uma noite de verão, não podia se matricular na escola, não era registrado, não tinha pai nem mãe, não tinha nome. Achou o nome da professora tão bonito que resolveu que dali por diante se chamaria  Marílio da Conceição. E assim ficou conhecido. 
            Já mais taludo, foi contratado por uma firma para derrubar matas. Era um trabalho escravo e dava-lhe muita pena matar as árvores. O rapazinho cortava as árvores com a motoserra e considera isso quase um assassinato. As árvores derrubadas não eram para fazer casa para abrigar uma família, nem mesa, nem tamborete, nem tear, nem violão. “Era matar por matar”. Com rasgos poéticos, vem o desabafo:
            “... matar árvore à toa é pior que matar gente e bicho, que pode se defender, pode gritar e correr. A árvore só geme e chora., verte lágrimas de ouro enquanto a peste da serra se afunda no tronco, e ela cai.” (p. 64)
            Foi dessa época de matador de árvores que lhe veio o apelido: Caroço. Depois que derrubava uma árvore por ordem do mateiro, ele se abraçava com o tronco querendo morrer também e colhia as sementes que se espalhavam pelo chão, colocava-as no bolso e saía semeando por onde passava daí os companheiros de infortúnio lhe darem esse apelido. 
            Vamo-nos aproximando do fim da história. Onde está o ouro? Não vou dizer, vou repetir palavras da autora: “Ah, esse é o grande segredo que só contarei no fim.” Acrescentamos – leiam o livro e saberão.
             Com “Ouro dentro da cabeça” (Ed. Autêntica, 2012), ilustrações de Diogo Droschi, Maria Valéria Rezende, escritora paulista, radicada na Paraíba há mais de 30 anos, conquistou o 3º. lugar no Prêmio Jabuti de literatura juvenil 2013. É um livro que apresenta as desigualdades e  as injustiças do mundo capitalista,  que clama por uma consciência ecológica e que defende o direito de ler de todos os cidadãos.  

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

"Primeira Palavra" e o Jabuti de Ilustração



“PRIMEIRA PALAVRA”  E O JABUTI DE ILUSTRAÇÃO
(Neide Medeiros Santos – Leitora votante FNLIJ/PB) 

Acredito na possibilidade de um livro influenciar o pensamento e, portanto, a vida de alguém.
(Elvira Vigna. Nota apensa ao livro “Primeira Palavra”).


            “Primeira Palavra” (Ed. Abacatte, 2012), texto de Tino Freitas e ilustrações de Elvira Vigna, ganhou o prêmio Jabuti de Ilustração 2013.   Tino Freitas é escritor cearense radicado em Brasília, e este texto já havia sido publicado na antologia de contos de autores de literatura infantojuvenil brasileira em espanhol no livro “Cuentos infantiles brasileños”, uma publicação da embaixada do Brasil na Costa Rica. Agora os leitores brasileiros desfrutam desta bonita história com belíssimas ilustrações de Elvira Vigna.
            Em 2011, publicamos na coluna “Livros&Literatura”, no jornal “Contraponto”, o artigo “A literatura brasileira vai à Costa Rica” com breves comentários sobre alguns dos 25 contos selecionados. Para compor essa antologia, foram escolhidos textos de literatura infantil publicados no Brasil  durante 40 anos (década de 1960 até o ano 2000).   
             “Primeira Palavra” ganhou o prêmio Jabuti de Ilustração, assim é bom conhecer um pouco do trabalho de Elvira Vigna. A ilustradora, que também escreve livros para crianças e adultos, nasceu no Rio de Janeiro, tem formação acadêmica em Jornalismo e cursos na área de Artes Plásticas, Cinema e Teatro.
Fui apresentada aos livros de Elvira Vigna por intermédio da professora Maria Antonieta Antunes Cunha. Nos idos de 1980, Elvira Vigna escreveu livros infantis para a editora Miguilim (na época esta editora era coordenada por Antonieta Cunha), e destacamos, entre eles, “Problemas com cachorro” (Ed. Miguilim, 1982) e “A pontinha menorzinha do enfeitinho do fim do cabo de uma colherzinha de café” (Ed. Miguilim, 1983). Depois vieram muitos outros livros escritos e ilustrados por essa autora. Roseana Murray escreveu vários livros de poesia que receberam ilustrações de Elvira Vigna. A produção literária e pictórica da artista da palavra e dos pincéis é vasta.
            Comecei a ler “Primeira Palavra” atraída pela ilustração. A capa apresenta um gato com pelos dourados e eriçados, tem um  olhar firme e está apoiado nas patas dianteiras em cima de livros  ou de uma mesa;  a seu lado aparecem alguns livros sem identificação dos títulos e dos autores. A quarta capa é toda em azul escuro e traz o chamamento da editora para o conteúdo do livro.
            Depois que terminei de ler a história, lembrei-me do conto de Andersen “A pequena vendedora de fósforos”. Tenho preferência especial por este conto.  Posteriormente, fui ler as observações feitas pelo autor na última página do livro e me deparo com esta afirmativa: A história... “que escrevi neste livro foi inspirada numa adaptação do conto “A Menininha dos Fósforos”, de Hans Christian Andersen que ganhei de minha mãe e li, emocionado, quando tinha cinco anos”.
            Vamos percorrer as páginas de “Primeira Palavra”, examinar o texto e as ilustrações. A intertextualidade já foi detectada com a explicação de Tino Freitas. 
              O cenário escolhido para o desenvolvimento da história é uma livraria, ou melhor, um local que vendia livros usados, um sebo. Um sebo contém livros mais valiosos do que uma livraria comum, lá se acham preciosidades. Livros de todo tipo são encontrados – livros de arte de literatura infantil, de imagens, romances, poesia, gibis, revistas antigas, almanaques, dicionários. Uma coleção variada que já passou pelas mãos de inúmeros leitores.  
             É nesse local cheio de livros antigos que mora um gato siamês.  O local era frequentemente visitado por uma menina, uma pedinte de rua, que não sabia ler, mas adorava mergulhar naquele labirinto de livros, principalmente na seção de livros infantis. Os preferidos eram aqueles que continham figuras. Havia um que cativava mais do que os outros – era um livro apenas de imagens – neste livro aparecia a ilustração de uma bruxa e um gato. Entre a menina e o gato do sebo se estabelece uma cumplicidade, um entendimento mútuo.
            Muitas vezes a menina adormecia encostada numa estante. Quando era hora de fechar o estabelecimento, o dono aparecia e a acordava, mostrando-lhe o caminho da rua.  Parecia não ter família, estava com sete anos e não sabia ler, nunca fora à escola. Contar, ela sabia. As pessoas davam-lhe algumas moedas, mas só sabia contar até vinte, Não havia necessidade de saber mais do que vinte, não conhecia dinheiro maior do que uma nota de vinte reais.
            No dia que completou oito anos, desejou ganhar um presente de aniversário e o melhor presente seria o livro da bruxa e do gato. Era um sonho quase impossível. Como arranjar dinheiro para comprar o livro?  O pouco que recebia das pessoas só dava para comprar alguma comida. Foi o medo e o desejo que forjaram um plano. O que aconteceu é surpresa, está bem contado na história de Tino Freitas. No desfecho, mais uma vez, encontramos intertextualidade com o conto de Andersen.
            Nas  ilustrações, um aspecto nos chama a atenção é  a presença das cores fortes – o azul intenso, o vermelho e o tom sombrio do local que aparece nas paredes da livraria. A figura da menina é vista sempre através de um reflexo de vidro ou espelho. Quando está fora da livraria,  olha para as estantes cheias de livros com olhos de espanto. O gato é retratado  muito bem postado em cima dos livros. Vigiando-os ou tentando adivinhar os segredos guardados nas páginas dos livros?  Gato é bom pensador!
            Visualizamos  lombadas de vários livros, só é possível ler o nome de um autor - Autran Dourado. Os outros não trazem títulos nem nomes dos autores.  Por que a escolha recaiu em Autran Dourado? Alguma ligação entre esta menina abandonada e a personagem Biela, de Autran Dourado? Conjeturas.
             Se o leitor ficar encantado pelas ilustrações como eu fiquei, irá gostar, também, da história urdida por Tino Freitas. Boa leitura é o que desejamos.
            Nota: Este texto vai para o menino Davi Pessoa que está aprendendo o que é intertextualidade.  

sábado, 2 de novembro de 2013

O lavrador de Ipanema: contos de amor á natureza




“O lavrador de Ipanema: contos de amor à natureza”
(Neide Medeiros Santos – Leitora Votante da FNLIJ/PB)

Se uma criança pudesse fazer um mapa de uma cidade – pensava eu, olhando o pé de romã – ele teria menos casa e mais bichos.
(Rubem Braga. O lavrador de Ipanema).

Há livros que cativam o leitor no primeiro olhar - “O lavrador de Ipanema” (Record: 2013) é um desses livros que ficamos apaixonados só em examiná-lo exteriormente. A capa é uma verdadeira obra de arte, projeto gráfico de Leonardo Iaccarino e ilustrações do premiado artista Andrés Sandoval. As ilustrações que antecedem os textos são belos quadros que retratam flores e frutas. O autor dos textos é o cronista Rubem Braga.
Este ano se comemora 100 anos do nascimento de Rubem Braga e o cronista sempre declarou e registrou em suas crônicas o amor à natureza,  chegou a transformar a cobertura do seu apartamento em um verdadeiro pomar, por isso Paulo Mendes Campos denominou-o “lavrador de Ipanema”. O livro da Record é um presente para os leitores e uma justa homenagem a quem revelou, em suas crônicas, uma verdadeira paixão pelo verde.  
Esta primorosa edição da Record traz Nota da editora assinada por Guiomar Grammont, Apresentação de Januária Cristina Alves e Leusa Araújo, crônicas de Rubem Braga escritas em tempos diversos e o texto biográfico - Rubem Braga em dez tempos.  
            O texto “Rubem Braga em dez tempos” apresenta uma biografia do autor, mas de modo bem original; as datas servem apenas como marco referencial para que o leitor situe certos fatos relacionados com a vida do cronista.
Através desse texto ficamos sabendo que, por suas posições contrárias ao integralismo e ao presidente Getúlio Vargas, Rubem Braga foi perseguido, preso e obrigado a assinar seus textos com pseudônimos. Na 2ª. Guerra Mundial, viajou para Itália como correspondente do Diário Carioca e foi o único correspondente de guerra a acompanhar a batalha de Monte Castelo. Amante da liberdade, Rubem Braga também denunciou, em suas crônicas no Jornal do Brasil, a violência cometida pela ditadura militar nos porões do Dops, isso causou mal-estar á direção do JB, fato que o obrigou a sair do jornal.
             Foram selecionadas 14 crônicas para este livro.  Cada crônica apresenta uma ilustração de Andrés Sandoval. Folhas, flores e frutas diversas se espalham pelas páginas desse bonito livro. Algumas crônicas são bem conhecidas como “Um pé de milho” e “O cajueiro”, esta última me fez retornar ao tempo em que lecionava Literatura Brasileira na antiga ETFAL. “O cajueiro” foi lido e comentado durante as nossas aulas. Os alunos gostavam muito desse texto, um deles chegou a escrever uma bela paráfrase a partir da crônica sentimental de Rubem Braga. O herói sacrificado não foi um cajueiro, mas um pé de maracujá. Bons tempos!
            ”Árvore” foi escrita quando Rubem Braga morava em Santiago do Chile e a imaginação do cronista voa como os pássaros. Ele compara o álamo que ficava junto à calçada do seu jardim a uma moça muito branca, de olhos verdes. E assim conclui essa crônica:  
“[...] o álamo junto do portão tem um vigor e uma pureza que me fazem bem pela manhã, como se todas as manhãs, ao abrir a janela, eu visse uma jovem imensa, muito clara, de olhos verdes, de pé, sorrindo para mim.” (2013: p. 63). Esta crônica traz a data de 1955.
Qual seria a profissão ambicionada por aquele homem simples? Resposta: “Protetor da natureza”. Ele jamais tivera um cargo público, mas gostaria muito de ser considerado um protetor da Natureza, protetor com p minúsculo, mas Natureza com N maiúsculo. E vem o pedido daquele pobre homem – não matem as borboletas azuis. Matar borboletas para viver! É horrível isso!
Quem se chamava Amarelo? Seria um menino pálido, magrinho? Ele era o maior amigo da infância de Rubem Braga. Impossível dizer quando nasceu, e permanece até hoje no mesmo local, mas já não é o mesmo, o tempo foi implacável - estava ali magrinho, tão sumido tão feio que cortou o coração do cronista. Seu amigo da infância não era um menino que hoje está velho, era o rio Amarelo que passava pertinho de sua casa e depois ia colocar suas águas no rio Itapemirim.
Há uma crônica bem antiga, é de 1935 – “Chegou o outono”, é do tempo em que o Rio de Janeiro era cortado por bondes. Como era gostoso andar no reboque do bonde na Rua Marques de Abrantes e ainda por cima era outono, o vento sacudia as folhas amarelas pelo chão. 
Este pequeno livro de Rubem Braga deveria ser adotado nas aulas de Geografia, de Literatura e de Direito Ambiental, os alunos aprenderiam a amar a Natureza e a ser lavrador de seu próprio bairro, da sua escola, da sua casa.
( Texto publicado no jornal “Contraponto”. João Pessoa, Paraíba, 01 a 17 de novembro de 2013, B-4.).