domingo, 23 de setembro de 2012



Monteiro Lobato: formador de leitores
(Neide Medeiros Santos – Crítica literária – FNLIJ/PB) 


            Lobato escrevia porque lia e porque queria ensinar a ler. Lobato foi, nessa ordem, leitor, escritor e formador de leitores.
            (Socorro Acioli. Aula de leitura com Monteiro Lobato).


            “Aula de leitura com Monteiro Lobato” (Biruta, 2012) é a versão revisada e editada da dissertação de mestrado de Socorro Acioli, defendida na Universidade Federal do Ceará – “De Emília à Dona Quixotinha: uma aula de leitura com Monteiro Lobato”.  O prefácio é da lobatóloga Marisa Lajolo que considera importante este trabalho porque ressalta uma das vertentes mais promissoras dos estudos literários – a inclusão da leitura entre seus objetos.  
            O livro está dividido em quatro capítulos assim delimitados: “Personagens leitores”, “Monteiro Lobato: uma vida para leitura”, “A leitura no sitio do Pica-pau Amarelo” e “Emília, leitora de Dom Quixote: um caso de leitura-ação”.  
            Monteiro Lobato foi jornalista, crítico, cronista, escritor de livros infantis, romancista, editor e teve forte atuação no mercado editorial brasileiro. Socorro Acioli ressalta o papel inovador de Lobato como editor - criou estratégias eficientes de propaganda e de divulgação dos livros, deu oportunidade a novos escritores e ilustradores, aumentou a rede de vendas de livros no país.
            Nesses comentários ao livro de Socorro Acioli, vamos apresentar, inicialmente, um Lobato leitor, seguindo-se o escritor e, por último, o formador de leitores.  
            Lobato leitor – Na infância, o escritor teve contato com a biblioteca do avô, o Visconde de Tremembé, e foi nesse ambiente mágico que Lobato despertou para a leitura. Em carta a Godofredo Rangel (Barca de Gleyre, vol.1, p.51), Lobato, assim, se expressa:
            “A biblioteca do meu avô era ótima, tremendamente histórica e científica. Merecia uma redoma. [...] Cada vez que naquele tempo me pilhava na biblioteca de meu avô, abria um daqueles volumes e me deslumbrava.”
            Sobre as práticas de leitura, o escritor guardou, entre as lembranças da infância, os momentos em que reunia as irmãs e os filhos dos empregados da fazenda de sua família e passava horas a fio lendo para eles. Este episódio contado por Lobato me conduziu até João Cabral de Melo Neto. No poema narrativo “Descoberta da literatura”, o poeta fala sobre os folhetos de feira que lia para os trabalhadores do engenho de sua família, local onde sempre passava as férias escolares.
             Lobato relembra que leu, na infância, os livros de Júlio Verne e “Robinson Crusoé”, este último foi um presente que recebeu de Natal e foi “lido e relido com um deleite inenarrável”.
            Lobato escritor – O primeiro artigo de Lobato foi publicado em 1896, no jornal O Guarani, organizado pelos alunos do Colégio Paulista em Taubaté, contava 14 anos de idade. O artigo trazia o título “Rabiscando” e era uma crítica ao livro “Enciclopédia do riso e da galhofa”. Trazia a assinatura de Josbem, um dos pseudônimos utilizados pelo escritor.
            Em 1903, aluno do curso de Direito no Largo São Francisco, em São Paulo, fundou o jornal “O Minarete” e publicou vários textos neste jornal. Em 1904, vamos encontrá-lo como colunista do “Jornal de Taubaté”, escrevendo, depois, para muitos outros jornais de São Paulo.
            Em 1920, Lobato lançou seu primeiro livro infantil – A menina do narizinho arrebitado. Este livro foi o início de uma longa séria de livros para crianças. Mas Lobato escreveu também para adultos – contos, crônicas, artigos críticos e romances.  
            É na literatura infantil que encontramos o Lobato maior, o escritor querido das crianças e ele reconhece que este era o caminho da salvação quando diz em carta a Godofredo Rangel: “Estou condenado a ser o Andersen dessa terra – talvez da América latina, pois contratei 26 livros infantis com um editor de Buenos Aires”. (Esta carta traz a data de 28 de março de 1943).
            Lobato formador de leitores – Socorro Acioli estabelece comparações entre o educador Edgar Morin e Monteiro Lobato, os dois têm uma visão de mundo semelhante. Tanto para Morin como para Lobato o importante é “formar cidadãos capazes de enfrentar os problemas de seu tempo”. No livro “O poço do Visconde”, o Visconde de Sabugosa estuda geologia para descobrir o petróleo; “Nos Serões de Dona Benta” e em “História das Invenções’, a investigação científica e a pesquisa são estimuladas.
            Vários livros de Lobato dedicados às crianças são analisados pela ensaísta cearense que procura demonstrar a preocupação de Lobato com a formação do leitor.
            Aliado a tudo isso, há destaque para os aspectos técnicos sobre livros, leitura e escrita por meio de esclarecimentos feitos por Dona Benta – explicando o que é prefácio, a diferença entre gente e personagem.
            O último capítulo do livro é dedicado à Emília como leitora de Dom Quixote e a paixão da bonequinha por esse personagem marcante da literatura universal.
            Para o crítico Antonio Candido, “a literatura infantil é talvez a mais difícil de todos os gêneros literários (...) gênero ambíguo, em que o escritor é obrigado a ter duas idades e pensar em dois planos”.
            Monteiro Lobato conseguiu vencer essa barreira – portou-se como um escritor de duas idades - às vezes é um adulto/professor, outras vezes é uma criança que sonha e brinca como criança.

            NOTA LITERÁRIA

            AINDA LOBATO

 A obra literária de Monteiro Lobato tem sido objeto de inúmeras discussões, isso desde o tempo da ditadura Vargas. Recentemente, técnicos do MEC questionam: Lobato foi racista? “Caçadas de Pedrinho” deve ser banido dos bancos escolares ou acrescido de algumas informações? No meio dessa polêmica improdutiva, os  escritores  – Socorro Acioli e Simão Almeida  - publicam livros que valorizam a leitura na obra lobatiana (Acioli) e o papel do jornalista Lobato (Almeida) nos meios culturais brasileiros nas primeiras décadas do século XX. Lobato continua despertando interesse.  




Um comentário:

Juliêta Barbosa disse...

Neide,

Uma das lembranças mais doces da minha infância é o cheiro do livro. Nasci em Campina Grande e, na Livraria Pedrosa, o meu olhar se perdia diante de tanta “fartura” para a minha fome de conhecimento.

Porém, cedo demais abandonei o hábito da leitura e me perdi no ambiente doméstico das fraldas e das panelas. Um tempo necessário para criação dos filhos e para as coisas simples do cotidiano. Mas, hoje, com uma solidão para administrar eu reencontro no prazer da leitura e, novamente, no cheiro dos livros, uma pátria de intimidades: o perfume da terra dos meus sonhos infantis e a alegria de poder caminhar por entre as letras e brincar com as palavras.

Nessa etapa é fundamental ler você e aprender mais. Obrigada!