Patrick
Modiano e a literatura infantil
(Neide
Medeiros Santos – Leitora votante FNLIJ/PB)
Permanecemos sempre os mesmos, e aqueles
que fomos no passado continuam a viver até o final dos tempos.
(Patrick
Modiano. Filomena Firmeza).
Patrick
Modiano, escritor francês, nascido em Boulogne – Billancourt, comuna francesa
situada nos arredores de Paris, foi o vencedor do Nobel de Literatura 2014. No
meio literário já conquistou vários prêmios, entre eles o Grand Prix de Romance
da Academia Francesa. Para o público infantil, escreveu “Filomena Firmeza”
(Cosac Naify, 2014), com ilustrações de Sempé e traduzido para o português por
Flávia Varella.
Em seus livros, notadamente nos ficcionais, Modiano deixa
transparecer fragmentos biográficos e históricos com o predomínio de temas que partem
em busca da identidade, da incompreensão diante dos problemas sociais, da
ocupação alemã na França. A figura do pai é constante em seus textos.
O ilustrador Sempé, um mestre do cartum, é natural de
Bordeaux, França. Na escola era
considerado displicente e muito distraído, estava sempre com um lápis na mão
desenhando. Depois de várias tentativas de emprego, resolveu dedicar-se ao
desenho e encontrou seu verdadeiro caminho. Para ilustrar “Filomena Firmeza”,
Sempé desenhou Paris, com destaque para os locais frequentados por Filomena e
seu pai, e apresentou alguns detalhes da cidade de Nova York.
O
livro de Patrick Modiano, além de proporcionar ao leitor um passeio pelas ruas
e bairros de Paris, apresenta cenas da vida cotidiana desta cidade nos anos
1940, o convívio familiar entre um pai e sua filha. No que se refere à
estrutura do livro, tudo é apresentado sob o olhar de um narrador
autodiegético, um narrador de 1ª pessoa. A história é contada em dois tempos
por Filomena (menina em Paris e adulta
em Nova York).
O
início do livro retrata o momento presente – Filomena está em Nova York e comenta
que há neve na cidade, isso ela divisa da janela do seu apartamento situado na Rua
59. No capítulo seguinte, através da técnica do flashback, pai e filha estão em
Paris, há um retorno de trinta anos.
Vamos examinar, inicialmente, o espaço
geográfico em que viviam o Sr. Georges e sua filha.
Filomena
morava com o pai em Paris, sua mãe era uma bailarina americana, morou algum
tempo em Paris, mas voltara para Nova York e continuava seu trabalho artístico.
Escrevia regularmente cartas para o marido e a filha e esperava que eles
viajassem um dia para Nova York para ficarem todos juntos.
O
pai de Filomena, Sr. Georges Firmeza, era sócio da loja – “CASTERADE&
FIRMEZA – Exp. Trans.”, situada na Rua d´Hauteville, nas proximidades da Gare du
Nord. O que significava Exp. Trans? O
pai sempre foi evasivo quando Filomena perguntava o que queria dizer Exp.
Trans. Seria Expedições? Exportações?
Trânsito? Transportes? O trabalho na loja era feito sempre à noite. Caminhões
paravam em frente ao estabelecimento comercial e empregados conduziam caixas e
mais caixas de mercadorias que eram guardadas nesse local. Um dia a menina encontrou um caderno de
registros com essas anotações: rádio, camisas, parafusos, calçados militares,
geladeiras, furadeiras, motores elétricos e outros itens bem diversificados.
Diante da insistência da filha para saber em que o pai trabalhava, ouviu esta
explicação: “Digamos que trabalho com
pacotes”. (p. 26)
A
escola que Filomena estudava ficava na Rua “Petits Hôtels” e o pai acompanhava a menina
no trajeto para a escola. Tudo girava em torno do 10º. “arrondissement” –
trabalho do pai, escola de Filomena, estações de trem – Gare du Nord e Gare de L´Est,
igreja Saint-Vincent–de-Paul.
O
Sr. Raymond Casterade era sócio de Firmeza na firma e a descrição que a
personagem narradora faz do sócio do pai não é muito lisonjeira: “era um homem
moreno, de olhos escuros e tronco muito comprido”, formado em letras, gostava de dar lições de moral a torto e a
direito, implicava com os descuidos gramaticais de Filomena. Dizia-se poeta e
recitavas versos de sua autoria bem como poemas de outros poetas franceses. Versos
e poemas enfadonhos.
Mas,
além de estudar, que outras coisas Filomena fazia?
Frequentava
uma escola de dança, certamente tinha pretensões de ser bailarina como a mãe. A escola ficava na Rua Maubeuge e a professora
era a senhora Galina Dismailova que mantinha um sotaque
russo bem forte . É nessa escola de dança que Filomena conhece Odile, uma
menina muito rica que convida Filomena e Sr. Georges para um coquetel de primavera.
A festa seria realizada em sua própria casa. No dia marcado, pai e filha
compareceram à festa, o ambiente era requintado e o Sr. Georges sentiu-se um
pouco deslocado. Filomena, talvez por
ser criança, estranhou apenas a pouca atenção que os anfitriões deram a seu
pai, estava muito feliz ao lado da amiga Odile. É nesse coquetel que Georges
conhece René Tabélion, o único convidado que conversou com Sr. Georges Firmeza.
Desse encontro com Tabélion, surge a
oportunidade do regresso para Nova York.
O
último capítulo do livro é um retorno ao presente. Filomena, acompanhada da
filha, visita seus pais que moram no bairro de Greenwich Village. Enfim, agora
estão todos juntos em Nova York.
O Sr
Georges continua com “negociatas”. Antes, em Paris, agora, em Nova York. Esse aspecto não fica bem esclarecido. Pouco importa. A vida continua e a história termina por
aqui.
(Nota:
Este texto vai para Célia Carvalho).
Nenhum comentário:
Postar um comentário