sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

Patrick Modiano e a literatura infantil



Patrick Modiano e a literatura infantil
(Neide Medeiros Santos – Leitora votante FNLIJ/PB) 


Permanecemos sempre os mesmos, e aqueles que fomos no passado continuam a viver até o final dos tempos.
(Patrick Modiano. Filomena Firmeza).

Patrick Modiano, escritor francês, nascido em Boulogne – Billancourt, comuna francesa situada nos arredores de Paris, foi o vencedor do Nobel de Literatura 2014. No meio literário já conquistou vários prêmios, entre eles o Grand Prix de Romance da Academia Francesa. Para o público infantil, escreveu “Filomena Firmeza” (Cosac Naify, 2014), com ilustrações de Sempé e traduzido para o português por Flávia Varella.
            Em seus livros, notadamente nos ficcionais, Modiano deixa transparecer fragmentos biográficos e históricos com o predomínio de temas que partem em busca da identidade, da incompreensão diante dos problemas sociais, da ocupação alemã na França. A figura do pai é constante em seus textos.
            O ilustrador Sempé, um mestre do cartum, é natural de Bordeaux, França.  Na escola era considerado displicente e muito distraído, estava sempre com um lápis na mão desenhando. Depois de várias tentativas de emprego, resolveu dedicar-se ao desenho e encontrou seu verdadeiro caminho. Para ilustrar “Filomena Firmeza”, Sempé desenhou Paris, com destaque para os locais frequentados por Filomena e seu pai, e apresentou alguns detalhes da cidade de Nova York.  
O livro de Patrick Modiano, além de proporcionar ao leitor um passeio pelas ruas e bairros de Paris, apresenta cenas da vida cotidiana desta cidade nos anos 1940, o convívio familiar entre um pai e sua filha. No que se refere à estrutura do livro, tudo é apresentado sob o olhar de um narrador autodiegético, um narrador de 1ª pessoa. A história é contada em dois tempos por Filomena  (menina em Paris e adulta em Nova York).  
O início do livro retrata o momento presente – Filomena está em Nova York e comenta que há neve na cidade, isso ela divisa da janela do seu apartamento situado na Rua 59. No capítulo seguinte, através da técnica do flashback, pai e filha estão em Paris, há um retorno de trinta anos.
 Vamos examinar, inicialmente, o espaço geográfico em que viviam o Sr. Georges e sua filha.
Filomena morava com o pai em Paris, sua mãe era uma bailarina americana, morou algum tempo em Paris, mas voltara para Nova York e continuava seu trabalho artístico. Escrevia regularmente cartas para o marido e a filha e esperava que eles viajassem um dia para Nova York para ficarem todos juntos.
O pai de Filomena, Sr. Georges Firmeza, era sócio da loja – “CASTERADE& FIRMEZA – Exp. Trans.”, situada na Rua d´Hauteville, nas proximidades da Gare du Nord.   O que significava Exp. Trans? O pai sempre foi evasivo quando Filomena perguntava o que queria dizer Exp. Trans.  Seria Expedições? Exportações? Trânsito? Transportes? O trabalho na loja era feito sempre à noite. Caminhões paravam em frente ao estabelecimento comercial e empregados conduziam caixas e mais caixas de mercadorias que eram guardadas nesse local.  Um dia a menina encontrou um caderno de registros com essas anotações: rádio, camisas, parafusos, calçados militares, geladeiras, furadeiras, motores elétricos e outros itens bem diversificados. Diante da insistência da filha para saber em que o pai trabalhava, ouviu esta explicação:  “Digamos que trabalho com pacotes”. (p. 26)
A escola que Filomena estudava ficava na Rua  “Petits Hôtels” e o pai acompanhava a menina no trajeto para a escola. Tudo girava em torno do 10º. “arrondissement” – trabalho do pai, escola de Filomena, estações de trem – Gare du Nord e Gare de L´Est, igreja Saint-Vincent–de-Paul.      
O Sr. Raymond Casterade era sócio de Firmeza na firma e a descrição que a personagem narradora faz do sócio do pai não é muito lisonjeira: “era um homem moreno, de olhos escuros e tronco muito comprido”, formado em letras,  gostava de dar lições de moral a torto e a direito, implicava com os descuidos gramaticais de Filomena. Dizia-se poeta e recitavas versos de sua autoria bem como poemas de outros poetas franceses. Versos e poemas enfadonhos.  
Mas, além de estudar, que outras coisas  Filomena fazia?
Frequentava uma escola de dança, certamente tinha pretensões de ser bailarina como a mãe.  A escola ficava na Rua Maubeuge e a professora era a  senhora  Galina Dismailova que mantinha um sotaque russo bem forte . É nessa escola de dança que Filomena conhece Odile, uma menina muito rica que convida Filomena e Sr. Georges para um coquetel de primavera. A festa seria realizada em sua própria casa. No dia marcado, pai e filha compareceram à festa, o ambiente era requintado e o Sr. Georges sentiu-se um pouco deslocado.  Filomena, talvez por ser criança, estranhou apenas a pouca atenção que os anfitriões deram a seu pai, estava muito feliz ao lado da amiga Odile. É nesse coquetel que Georges conhece René Tabélion, o único convidado que conversou com Sr. Georges Firmeza.  Desse encontro com Tabélion, surge a oportunidade do regresso  para Nova York.
O último capítulo do livro é um retorno ao presente. Filomena, acompanhada da filha, visita seus pais que moram no bairro de Greenwich Village. Enfim, agora estão todos juntos em Nova York.
O Sr Georges continua com “negociatas”. Antes, em Paris, agora, em Nova York.  Esse aspecto não fica bem esclarecido.  Pouco importa.  A vida continua e a história termina por aqui.
(Nota: Este texto vai para Célia Carvalho). 


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