sábado, 19 de março de 2011

​A Memória Vegetal e outras memórias-Umberto Eco




​A Memória Vegetal e outras memórias
​(Neide Medeiros Santos – Crítica literária FNLIJ/PB)
 
“... a biblioteca não é somente o lugar da sua memória, onde você conserva o que leu, mas o lugar da memória universal, onde um dia, no momento fatal, será possível encontrar aqueles outros que leram antes de você.”
(Umberto Eco. A Memória Vegetal e outros escritos sobre bibliofilia (2010: p. 49)
 
A Editora Record publicou em 2010 dois importantes livros que foram indicados para jovens pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil.  O primeiro – “Não contem com o fim do livro” – traz   um erudito debate entre Jean-Claude Carrière e Umberto Eco, intermediado pelo ensaísta e jornalista Jean-Philippe de Tonnac.  O outro é “A Memória Vegetal e outros escritos sobre bibliofilia”, de Umberto Eco.
Jean-Claude Carrière, reconhecido dramaturgo e roteirista, é também escritor e colecionador de livros raros. Umberto Eco, semiólogo e estudioso de línguas antigas, orgulha-se dos livros antigos que adquiriu no decorrer de sua vida. Tanto Carrière quanto Eco acreditam na sobrevivência do livro e partem do seguinte princípio: A fotografia matou o quadro? A televisão o cinema?
Mas é sobre este último – “A Memória Vegetal” – que deitamos nosso olhar. No dia 12 de março, comemorou-se o dia do bibliotecário e para escrever este artigo escolhemos este livro que fala sobre bibliotecas e sobre pessoas que cuidam dos livros com amor e muito zelo.
A primeira parte do livro é toda dedicada à bibliofilia, bibliomania, bibliocastia e bibliotecas e Eco faz importantes observações sobre essas sutis diferenças.
Bibliófilo é aquele que devota amor ao livro. Eco explica que guarda até hoje com muito carinho um exemplar de “Philosophie au Moyen Age”, de Gilson, dos anos 1950. Este livro foi seu companheiro constante na época que estava escrevendo a tese de doutorado. Hoje está gasto pelo tempo, esfarelado, mas está ligado aos anos de sua formação acadêmica e preso às suas lembranças. Tem um valo afetivo.
Para explicar o que é a bibliomania, o autor parte do seguinte exemplo: um bibliômano compra um livro raro e guarda-o como um tesouro com a avareza de um tio Patinhas, não mostra o livro a ninguém. Se esse mesmo livro fosse comprado por um bibliófilo, ele gostaria de mostrar a todos os seus amigos bibliófilos e se possível colocaria até em exposição para que muitas pessoas admirassem aquele objeto raro.
O bibliocasta é o inverso, ele cuida mal dos livros, deixa-os desaparecer por descuido, vende-os aos pedaços. Eles parecem ter mais valor quando são mutilados.
O colecionador de livros não deve ser confundido com o bibliófilo. Os colecionadores querem ter tudo sobre um determinado tema, para eles o que importa “não é a natureza das peças isoladas, mas a completude da coleção”. O bibliófilo, mesmo quando trabalha sobre um determinado tema, espera que a coleção não se complete nunca, existe sempre um livro à sua  espera  
Pedro Nava, nas memórias, revelou-se um leitor apaixonado. Em “Galo-de-trevas,” quinto volume das suas memórias, o escritor revela o prazer que sentia quando abria as estantes e passava as mãos pelos couros, carneiras, pergaminhos. A sensação era a mesma que sentia ao passar a mão pela pele amada.                                  
Umberto Eco externa seu culto ao livro dessa maneira:
“Como é belo um livro que foi pensado para ser tomado nas mãos, até na cama, até num barco, até onde não existem tomadas elétricas, até onde e quando qualquer bateria se descarregou, e suporta marcadores e cantos dobrados, e pode se derrubado no chão ou abandonado sobre o peito ou sobre os joelhos quando a gente cai no sono, e fica no bolso, e se consome, registra a intensidade, a assiduidade ou a regularidade das nossas leituras e nos recorda (se parecer muito fresco ou intonso) que ainda não o lemos... (p.54)  
O livro de Umberto Eco nos transporta para outras leituras, para lembranças de poemas lidos.  Há um poema de Mário Quintana que, com poucas palavras, define o que é um livro na mão de um leitor.
“O livro traz a vantagem de a gente poder estar só e ao mesmo tempo acompanhado”.
Falei apenas da primeira parte do livro de Umberto Eco, há mais três esperando pelo leitor.
Nota: Os dois livros citados podem ser encontrados na Livraria Leitura.

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