Tecer considerações sobre livros e autores a partir da literatura produzida para crianças e jovens no Brasil. Os textos deste espaço estão disponíveis para pesquisa; devendo-se, em caso de citação, indicar a fonte, conforme a legislação em vigor: LEI Nº 9.610
segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011
A DONZELA GUERREIRA: resgate e reconto/Histórias à Brasileira. A Donzela Guerreira e Outras
LIVROS &LITERATURA
(Neide Medeiros Santos – Crítica literária –FNLIJ/PB)
A DONZELA GUERREIRA: resgate e reconto
Sempre acreditei que, no Brasil, só é nacional o que é popular ou então aquilo que é ligado ao popular.
(Ariano Suassuna)
É difícil determinar quando surgiu o vínculo literatura popular x literatura infantil. Se pesquisarmos os contos de Perrault, dos irmãos Grimm, de Andersen, iremos encontrar a junção dos contos de fadas com os contos de origem popular. Na literatura brasileira, o interesse por esses contos desponta com os pesquisadores Sílvio Romero e Câmara Cascudo.
Depois dos folcloristas nordestinos, outros escritores brasileiros se dedicaram à pesquisa do veio popular. Marisa Lajolo e Regina Zilberman (1986) afirmam que os elementos da extração popular se apresentavam, inicialmente, de modo conservador. Muitos escritores se limitavam a “republicação de velhas histórias folclóricas”.
Monteiro Lobato e José Lins do Rego, na década de 30 do século XX, deram um tom mais nacional aos contos de origem popular e se aproximaram do falar do povo brasileiro. A partir dos anos 70 e 80, do mesmo século, essas histórias são recontadas por escritores que se preocupam com a renovação linguística e compromisso com a esteticidade da palavra/imagem. Ângela Lago, Ricardo Azevedo, Ciça Fittipaldi, Joel Rufino dos Santos e Ana Maria Machado integram a nova fase de recontadores de velhas histórias.
“Histórias à Brasileira. A Donzela Guerreira e Outras” (Companhia das Letrinhas, 2010), com ilustrações de Odilon Moraes, é o 4º. Volume do projeto de resgate e reconto de histórias da tradição popular da escritora Ana Maria Machado.
“A Donzela Guerreira” pode ser encontrada com o título” Donzela que foi à guerra”. É muito difundida entre os cordelistas e está presente no “Romanceiro” de Almeida Garrett.
O tema da mulher que se veste de homem para esconder sua verdadeira identidade é recorrente na literatura popular e erudita. Guimarães Rosa foi buscar na fonte popular a base para criar um dos personagens mais emblemáticos da literatura brasileira – Diadorim.
Vamos entrar na história do resgate e reconto de Ana Maria Machado.
Há muitos e muitos anos, no reino de Aragão (Espanha), um súdito fiel lamentava porque só tinha filhas mulheres e não podia mandá-las à guerra para defender o reino. A filha mais velha pediu ao pai:
“Dai-me armas e cavalo
que irei de capitão”.
O pai recusou o pedido da filha com esta desculpa:
“Filha, tens cabelos grandes.
Filha, te reconhecerão.”
A filha não desistia, afirmava que era capaz de lutar como se fosse um cavaleiro. O pai argumentava que ela tinha os seios grandes e seria facilmente identificada, mas a donzela era teimosa e sabia dar soluções para todos esses problemas. E estava tão decidida que o pai acabou permitindo que ela partisse.
Durante a peleja com os inimigos, portou-se como um cavaleiro corajoso e ousado, conquistando várias vitórias. Os defensores do rei saíram vitoriosos. Entre os nobres lutadores, havia um conde que fez amizade com a falsa donzela que adotara o nome de Luís. Após o término da luta, o conde convidou o amigo para passar uns dias em sua casa. A donzela aceitou o convite do conde Damião e à noite, após uma caçada, o rapaz comentou com a mãe:
“Os olhos de Dom Luís matar-me-ão.
Seus gestos são de homem.
Seus olhos de mulher são.”
A mãe do conde sugeriu ao filho uma série de provas para saber a verdadeira identidade de Dom Luís. Com muita astúcia, a donzela conseguiu enganar o conde, mas não por muito tempo. No fim da história, cai o disfarce e o segredo é revelado.
Para recontar esta história, Ana Maria Machado leu textos de Sílvio Romero, Câmara Cascudo, Monteiro Lobato e de muitos outros escritores, não deixou de recorrer à literatura de cordel. Como quem conta um conto aumenta um ponto, ela misturou diversos elementos, inventou outros, resgatou e recontou uma história que veio do além-mar e que ela ouviu na infância de uma tia-avó.
“Histórias à Brasileira: A Donzela Guerreira e outras” se compõe de dez histórias; as outras nove estão à espera do leitor.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário