sexta-feira, 15 de abril de 2011

Leitura para um dia de chuva-Eça de Queiroz



Leitura para um dia de chuva
(Neide Medeiros Santos – Crítica literária FNLIJ/PB)

Foi para ti
que desfolhei a chuva.
(Mia Couto. Para ti)

Eça de Queiroz foi um escritor muito lido nos fins do século XIX e nos primeiros anos do século XX em Portugal e no Brasil. Graciliano Ramos era um assíduo leitor das páginas queirozianas, leu “Os Maias” dezessete vezes e sabia trechos decorados do grande romance.
Antonio Candido escreveu inúmeros ensaios sobre os livros do romancista português e participou com um breve comentário no verso da capa de “Um dia de chuva”, conto de Eça de Queiroz, publicado pela Cosac Naify, editado em 2011, com ilustrações de Guazzelli. É leitura indicado para jovens, mas será bem recebida pelos adultos.
Vejamos o que nos diz o crítico paulista a respeito desse conto:
“O enredo é simples, tecido tchekhovianamente com quase nada, fino e leve como teia de aranha. [...] Narrativa de atmosfera, cujo princípio estrutural é a surda competição entre a chuva que fecha o mundo e a imagem solar da moça que rompe as brumas.”
“Um dia de chuva” é uma publicação póstuma. O texto só veio a ser conhecido em 1929 porque Eça de Queiroz Filho resolveu editá-lo. Foi incluído em “Cartas Inéditas de Fradique Mendes” e em “Mais Páginas Esquecidas”. No Brasil, apareceu na obra completa de Eça de Queiroz da Nova Aguilar.
A história se passa durante uma “chuva agreste e ventosa”, no “meado já quente de abril”. Vamos ao encontro do texto.
José Ernesto é um homem rico, solteiro, mora em Lisboa e quer adquirir uma quinta para reunir os amigos e desfrutar dos prazeres de um local cheio de grandes árvores, de pássaros e de regatos. Quando estudava em Coimbra, D. Patrício, seu “companheiro de casa”, falava sempre no solar de S. Braz, herança da família, um lugar aprazível com avenidas de carvalho, cascatas, roseiras e um mirante que dava vista para o rio. O estudante ouvia a descrição do amigo e pensava: “Que diabo, quando for rico, hei de ter o meu S. Braz!”. (p.6).
A hora havia chegado. Herdara a fortuna do tio Bento e, ao folhear a publicação “Novidades”, leu a noticia da venda de uma quinta em Paço-de-Loures, situada na região norte de Portugal. O dono era um fidalgo de Província, D. Gaspar Alcoforado. Escreveu para o proprietário e este lhe propôs uma visita ao local e que procurasse se comunicar com o padre Ribeiro, encarregado de mostrar a propriedade.
Em meados de abril, José Ernesto viajou. Ficou acertado que o padre iria esperá-lo na estação de trem e de lá seguiriam para o Paço-de-Loures. Tudo aconteceu de acordo com o combinado, mas veio uma chuva torrencial que não permitiu ao futuro comprador conhecer a quinta na sua totalidade. As gentilezas do caseiro Braz, a deliciosa comida servida durante seus dias de permanência, as grandes salas, tudo indicava uma inclinação para a compra da quinta.
Durante os dias que ficou em Paço-de-Loures, José Ernesto ouviu muitas conversas do padre Ribeiro sobre a família Alcoforado. Dom Gaspar Alcoforado possuía três filhas, sendo que a mais nova, D. Joana, era linda, loura, parecia “um sol”. Além de todos os atributos físicos, era “grande cavaleira”. A descrição da moça foi rica em minúcias, agora José Ernesto tinha dois desejos: comprar a quinta e conhecer a moça bonita e loura.
A casa e a chuva funcionam como motivos condutores da narrativa. A chuva impede sair da casa para conhecer a quinta. Só resta ao futuro comprador aproveitar as delícias da boa culinária, ouvir o incessante barulho da água caindo do céu e as conversas do padre Ribeiro.
O resto da história é para ser lida em dia de chuva junto com as águas de abril.
Eloar Guazzelli, artista plástico, fez as ilustrações deste conto. Utilizou apenas duas cores – marron e azul. Os detalhes da arquitetura portuguesa e os azulejos estão presentes nas 15 ilustrações que emolduram o livro.
Beatriz Berrini, estudiosa de Eça de Queiroz e professora de literatura portuguesa da PUC/SP, colocou notas no corpo do texto, esclarecendo algumas trocas de nomes de personagens e dos lugares. As interrogações indicam trechos que foram perdidos. Lembramos que Eça de Queiroz não fez a revisão final do conto, é uma edição póstuma.

Um comentário:

Valéria de Oliveira Alves disse...

Adorei o artigo. Também fiz referência a esse livro em meu site e indiquei o seu blog para os meus leitores. Veja em: www.sitedeliteratura.com
Parabéns!!!