sábado, 30 de agosto de 2008

ELIAS JOSE NO CEU


Artigo - Elias José no céu
Toc, toc, toc...- Quem bate? - Sou eu, Elias José. - Entra, Elias José. Você não precisa pedir licença.(Diálogo intertextual com o poema de Manuel Bandeira - Irene no céu)
Neide Medeiros Santos, Professora e Crítica Literária (FNLIJ/PB)
Elias José, o poeta mineiro de Santa Cruz da Prata, partiu silenciosamente, sem tempo para despedidas, teve o mesmo destino de Augusto dos Anjos - uma pneumonia levou-o para o céu.
É difícil dizer quantos livros Elias José escreveu, foram muitos e muitos livros. Ultimamente vinha publicando livros dedicados à crítica poética e à leitura. "Poesia pede passagem: um guia para levar a poesia às escolas" (Ed. Paulus, 2003) recebeu o prêmio Altamente Recomendável pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil em 2004. Em 2007, publicou "Literatura Infantil: ler, contar e encantar crianças" (Ed. Mediação).
Os livros teóricos mais recentes atestam a preocupação de um professor de literatura com o fazer poético. Elias José foi professor de Teoria da Literatura e Literatura Brasileira em Guaxupé (MG) e suas aulas deviam ser tão poéticas quanto os textos que escreveu para a meninada e para os adultos que têm alma de criança.
"Literatura infantil: ler, contar e encantar crianças" é direcionado para professores, pais e para aqueles que lidam com leitura e literatura em diferentes níveis. São nove artigos que transitam do universo infantil para o tom confessional. Dentro desse universo de nove textos, destacamos "Sobre canções e leituras" (7º. artigo) e o último -" Como me tornei um escritor".
"Sobre canções e leituras" (p.69-76) fala a respeito do programa "Sem Censura", apresentado por Leda Nagle, na TVE Brasil, no Rio de Janeiro e, de forma especial, uma homenagem que foi prestada à cantora Maria Betânia em janeiro de 2007, na passagem dos 60 anos da grande intérprete brasileira. Naquela ocasião, foi organizada uma mesa-redonda e estavam presentes pessoas envolvidas na carreira da homenageada - entre outros, o maestro Jaime Alem, Bibi Ferreira, a cantora Miúcha, a atriz Renata Sorrah e a professora Vânia Correa Dutra. Vale a pena relatar o trabalho desenvolvido por essa professora entre jovens moradores da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.
Depois que todos falaram, Betânia cantou e chegou o momento da fala da educadora. Vânia é professora de Filosofia em uma escola pública do Rio. Seus alunos são os moradores da periferia do bairro da Barra da Tijuca e nesse local ela desenvolve um projeto pedagógico sobre a cultura brasileira, apoiando-se no repertório de Maria Betânia. Como material didático utiliza o CD e o DVD que trazem o mesmo título "Brasileirinho". Através das músicas deste disco, que envolve poemas de Ildásio Tavares, Mário de Andrade, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Guimarães Rosa, Vinicius de Moraes e outros escritores, a professora conseguiu transformar suas aulas de Filosofia em maneiras diferentes de ler o mundo, sem o tradicionalismo das noções filosóficas.
Que belo exemplo essa professorinha nos dá! Utilizo o diminutivo de forma carinhosa, afetiva. Precisamos de outras Vânias para que o ensino de certas disciplinas se torne ameno e agradável. "Como me tornei um escritor" (p. 93-103) é um texto que relata, de modo bem simples, o percurso leitor/professor/poeta e vem a revelação:
"Tenho um carinho especial pelos livros de poesia infantil, pois sei que este é um gênero especial, que exige que o autor se torne criança e brinque com as palavras e com o imaginário, com toda liberdade. Escrevendo poesia para crianças, torno-me criança outra vez, faço vir à tona o menino que fui". (p.96).
Conhecendo bem os livros de poesia de Elias José, quando a revista Crescer nos pediu que selecionássemos os 30 Melhores livros de literatura infantil produzidos para crianças entre 2007/2008 não tivemos dúvida, incluímos o livro "Lua no brejo com novas trovas" (Ed. Projeto, 2007), ricamente ilustrado por Graça Lima. Este livro teve a 1ª. edição em 1987 e recebeu, naquela ocasião, o prêmio Monteiro Lobato de melhor livro de poesia para crianças, concedido pela União Brasileira de Escritores.
Muitos já ouviram a expressão popular: "a vaca foi pro brejo", mas o que seria uma lua no brejo? Só a leitura do livro pode nos fornecer alguma pista.
"Lua no brejo e novas trovas" contém 25 poemas. Canções e brincadeiras populares, como "História embrulhada" (atirei o pau no gato); "Acalanto" (boi da cara preta); "Coisas esquisitas" (a barata na careca do vovô); repetições de sons e trava-línguas "O pato", "O rei e o rato", não faltando poemas laudatórios ao mar e à sereia, todos integram esse universo poético encantador. Para concluir o livro, aparece uma seleção de trovas.
A bonita capa criada por Graça Lima apresenta um casal de sapos de mãos dadas, olhinhos fechados, sentados em uma pedra, localizados no meio da lagoa. Vaga-lumes e pontos luminosos (estrelas) dão um toque de brilho ao escuro do céu, mas o que nos chama a atenção é uma enorme lua prateada que toma grande parte da capa. Com esta expressiva capa, Graça Lima conseguiu captar a intenção do poeta - estamos diante de uma noite de lua no brejo.
Se hoje não desfrutamos mais da presença amiga do poeta Elias José, ficaram seus poemas que encantaram os leitores de ontem e, certamente, irão encantar os leitores de amanhã. Tem razão Drummond quando afirmou: "As coisas tangíveis/ tornam-se insensíveis /à palma da mão. /Mas as coisas findas, /muito mais que lindas, / essas ficarão". (Memória. In: Claro Enigma)

Um comentário:

Anônimo disse...

Olá Neide !
Primeiro quero parabenizá-la pelo belo blog , muito bem construído e ricamente informativo !
Li todo seu perfil depois li o artigo do Elias José no Céu !
Vc sempre muito criativa teceu justa homenagem ao notável escritor. Gostei da forma carinhosa como descreveu o Elias entrando no céu e o toc-toc da batidinha na porta.
Neide seu blog serve muito de estudo pra quem gosta de literatura pois ficará atualilzado com notícias de publicações interessantes dos mais diversos autores.
Ah! Quando li pela primeira vez não tinha o vídeo. Simplesmente essencial.
Desejo muito sucesso em seu blog e continue sempre assim mantendo as pessoas que gostam de literatura "antenadas "com o que há de bom no mundo encantado da literatura infanto-juvenil.
Da amiga e ex-aluna Denise Alencar